APOLOGÉTICA CRISTÃ: COMPATIBILIZANDO FÉ E RAZÃO!



INTRODUÇÃO

A apologética cristã se destina a defender argumentativamente a fé cristã através da divulgação da Palavra de Deus de forma coerente e compreensível. Assim sendo, os argumentos apologéticos têm que ser, ao mesmo tempo, coerentes com a razão e com a fé.

Este é o desafio de todo apologista cristão: Apresentar argumentos que satisfação a razão humana e que não limitem a fé. Para isso, é preciso compreender a natureza da razão e da fé e suas implicações na vida prática do homem. O que é razão? O que é fé? Razão e Fé são atributos compatíveis?

Somente um estudo detalhado será capaz de lançar luz para estas indagações.

DEUS É INEXPLICÁVEL

Quando se diz que Deus é inexplicável, é preciso entender que é impossível conhecer a Deus de forma plena e exclusivamente racional. Tanto a fé, quanto a razão, são elementos finitos que se destinam a compreender um pouco sobre um Deus infinito e sua vontade soberana.

A fé e razão são dádivas de Deus que se destinam a serem instrumentos pelos quais Deus se revela ao homem de forma progressiva e humanamente tolerável. Pois, como seres finitos e, portanto, limitados, não possuímos uma estrutura que consiga compreender e armazenar tudo o que Deus é e tudo o que é Deus. Deus nos revelou um pouco sobre quem Ele é e sobre sua vontade, a fim de se relacionar conosco e para que pudéssemos ter consciência da grandeza e responsabilidade deste relacionamento com Ele.  

Muitos não creem em Deus exatamente porque tentam conhecê-lo plenamente e através da razão. Não aceitam qualquer atributo divino que não possa ser explicado e compreendido exclusivamente pela razão. O culto a racionalidade, realizados por alguns, acabam por excluir a possibilidade de fé. 

Deus é onipotente, onisciente, onipresente, eterno, imutável, autoexistente, autossuficiente, infinito e transcendente. Tais palavras soam como delírio para o adorador da razão, mas são acalentos e regozijo para a fé.

A. W. Tozer, no livro “O conhecimento do Santo”, faz a seguinte pergunta:

Se Deus não é aquilo que achamos, como pensaremos nele então? Se ele é verdadeiramente incompreensível, como afirma o credo, e inacessível, como afirma Paulo, como seria possível a nós, cristãos, saciar nosso anseio por ele? As esperançosas palavras ‘Reconcilia-te, pois, com Ele e tem paz’ permanecem verdadeiras século após séculos. Mas como nos aproximar daquele que frustra os maiores esforços da mente e do coração? [...] A resposta bíblica é simples: ‘através de Jesus Cristo nosso Senhor’’’ (Tozer, pg. 23 e 24).  
Quando falamos de apologética cristã, é preciso entender que esta não tem por objetivo explicar Deus de forma plena. A apologética cristã se destina a explicar aquilo que Deus decidiu nos revelar acerca de si e de sua vontade. Para isso, a apologética utilizará a fé e a razão como atributos que se prestam a trazer compreensão sobre a vontade revelada de Deus.

A RAZÃO E A FÉ SÃO DÁDIVAS DE DEUS:

É exatamente pelo fato de Deus não poder ser compreendido pelos esforços pessoais do homem, haja vista seu imensurável poder e sua magnífica sabedoria, é que Deus criou meios para se revelar ao homem de forma que este pudesse conhecer, ainda que limitadamente, seus atributos e sua vontade.

A razão nos foi dada no ato de criação. Em Gn. 1: 26 e 27, lemos que Deus fez o homem à Sua imagem e semelhança, ou seja, Deus, ao nos criar, nos delegou certos atributos morais a fim de que tivéssemos condições de nos relacionar com Ele. Desta forma, Deus nos conferiu os atributos da justiça, amor, bondade, santidade, fé e intelecto ou razão, etc. Assim sendo, a razão é um atributo que só temos pelo fato de que fomos criados a imagem e semelhança de Deus.

É importante destacar que, após a queda do homem, todos esses atributos, inclusive a razão, foram escravizados pelo pecado, limitando, assim, o uso dos mesmos.

Igualmente, a é um dom de Deus, pois é o poder divino que nos capacita a crer naquilo que a razão não consegue compreender sozinha. A fé, compreendida como um dom, é a capacidade para crer, já o crer, compreendido como uma ação humana, é o exercício da fé.

Paulo fala sobre a natureza dadivosa da fé em Ef. 2:8, vejamos:

“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus” (grifo nosso).

O apóstolo dos gentios enfatizava que a fé é um dom divino que serve de instrumento para que a graça de Deus se revele, salvadoramente, ao homem.

Logo, se a razão e a fé são dons de Deus, estes precisam ser usados em harmonia e equilíbrio. A razão e a fé não são elementos opostos e contradizentes, são, de fato, elementos complementares e dependentes uma da outra a fim de compreender tudo aquilo que o Deus incompreensível decidiu nos revelar.

O QUE É A RAZÃO?

É a capacidade, dada por Deus, do ser humano de assimilar e atribuir conceitos e verdades e de questionar tais conceitos e verdades de forma a determinar a coerência ou a incoerência de determinada situação, conceito ou suposta verdade.   

Em outras palavras, a Razão é a capacidade do homem de assimilar e identificar toda a revelação divina, ou seja, tudo aquilo que Deus decidiu revelar ao homem através da criação ou de sua sagrada Palavra.

Em Rm 1:20, Paulo vai dizer que:

“Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis”.

Paulo argumenta que ninguém poderá alegar para Deus que não teve condições de compreender a vontade dele, pois, toda criação testifica sobre Deus e sua vontade e, pela razão, é possível entender que existe um criador.

O QUE É FÉ?

A fé pode ser entendida como sendo a percepção e o reconhecimento do homem quanto à veracidade das Escrituras e a realidade sobre Deus.

Enquanto a razão consegue compreender a revelação geral de Deus, ou seja, a criação, a fé é elemento essencial para que o homem consiga ir aonde a fé não consegue ir: na veracidade das Escrituras e na compreensão do verdadeiro Deus. A razão se limita a revelação geral, já a fé é capaz de entender a revelação especial de Deus.

A fé potencializa a razão ao influenciá-la em três aspectos:

I – Aspecto intelectual: O homem passa a compreender a veracidade das coisas espirituais, incluindo a realidade acerca de Deus e de sua Palavra;

II – Aspecto emocional: a fé injeta no homem um sentimento que o provoca vontade de conhecer a Deus e de compreender a sua vontade. A fé estimula a razão a entender a vontade divina;

III – Aspecto volitivo: a fé faz com que o homem assimile a vontade de Deus e, assim, faz com que o homem passe a praticar conscientemente as obras salvificamente boas.

Desta forma, a fé não se trata de um atributo cego e sem fundamento. A verdadeira fé tem por fundamento a Palavra de Deus (Rm 10:17), ou seja, a Palavra de Deus sustenta a nossa fé e, por consequência, a razão.

REVELAÇÃO GERAL E ESPECIAL:

Quando se fala em fé e razão, é preciso entender que estes atributos servem para compreender tudo aquilo que Deus nos revelou. Assim sendo, a teologia costuma dividir a revelação de Deus em “Geral” e “Especial”.

Revelação Geral é compreendida como toda a criação de Deus, ou seja, tudo o que Deus criou, o céu, a terra, os animais, o universo, os seres humanos, revelam, em certa medida, algo sobre Deus. Toda a criação revela que um Deus criou tudo o que existe e, também, revela o poder deste Deus. Não é por acaso que todas as civilizações antigas, ao contemplarem a criação, passaram a adorá-la, pois, entendiam que tudo o que existe possui uma origem divina. Como se pode compreender, a revelação geral não salva ninguém, porquanto somente mostra ao homem que o universo foi criado por um Deus, mas não diz quem é esse Deus. A revelação geral, por si só, não consegue trazer compreensão ao homem sobre quem é esse Deus que tudo criou, portanto, não consegue levar o homem a adorar conscientemente ao verdadeiro Deus. Para que o homem possa ter uma verdadeira compreensão sobre quem é esse Deus que criou tudo o que existe, foi preciso que Deus se revelasse de maneira especial ao homem, a isto chamamos de revelação especial.

Revelação Especial é compreendida como todas as formas em que Deus se revelou pessoalmente ao homem a fim de mostrar sua verdade e vontade. Por revelação especial temos a Bíblia e o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo. Enquanto a Revelação Geral diz que existe um Deus que criou o universo, a Revelação Especial apresenta ao homem quem é esse Deus.

Quando olhamos para universo, percebemos que tudo o que existe só pode ser obra de um ser superior e poderoso (revelação geral). Mas, somente quando olhamos para a Bíblia é que compreendemos quem é esse Deus poderoso é qual a sua vontade para suas criaturas (revelação especial).

 A fé e razão são atributos essenciais na compreensão correta da Revelação Geral e Especial. Logo, a apologética cristã, deve utilizar os elementos e informações da Revelação Geral e Especial a fim de construir uma defesa com argumentos coerentes e sólidos, quanto as doutrinas bíblicas.  

Um exemplo em que é possível utilizar a revelação geral e especial na defesa argumentativa da fé é o que se segue: a ciência diz que o homem, provavelmente, possui sua origem na terra, pois, a maioria dos elementos que se encontra em uma terra virgem, nós encontramos no homem (revelação geral). Já a Bíblia, diz que Deus formou o homem do pó da terra (Gn 2:7) e é exatamente por isso que nós possuímos os elementos que se encontra na terra (revelação especial).

Esse tipo de argumentação satisfaz tanto os requerimentos da razão, quanto os da fé.

O CULTO A RACIONALIDADE:

O racionalismo foi um movimento da modernidade que inspirou todas as correntes da ciência e, inclusive, a teologia. Ocorre que, em decorrência de uma supervalorização da razão, muitos passaram a cultuá-la como o único meio de alcançar a verdade.

A razão foi entronizada como o único instrumento de compreensão da verdade e, portanto, tudo o que a razão não podia entender por ela mesma, era rejeitado de plano e julgado como algo falso e desnecessário ao homem. Consequentemente, a religião e, principalmente, a fé em um Deus onipotente, onisciente, onipresente, eterno, imutável, autoexistente, autossuficiente, infinito e transcendente, foi tido como algo falso, inexistente e desnecessário ao homem racionalista.

Infelizmente, esse culto a razão entrou, inclusive, para dentro da igreja. Muitos segmentos do cristianismo deixaram de crer em um Deus trino, onipotente, que concede dons a igreja, simplesmente por não entenderem tais doutrinas através da razão. Preferiram relativizar tais doutrinas a fim de molda-las ao racionalismo teológico que os dominam.

Frederick W. Faber certa vez escreveu que a compreensão sobre Deus é “trevas para o intelecto, mas luz do sol para o coração” (Frederick apud Tozer, “O conhecimento do Santo”, pg. 25, 2018).

Diante deste contexto, a apologética cristã é essencial a fim de mostrar que a fé e a razão são perfeitamente compatíveis e complementares. É possível entendermos tudo aquilo que Deus nos revelou quando unimos a fé com a razão.

Em outras palavras, o casamento da fé com a razão faz nascer uma igreja consciente de seu propósito e capacitada para revelar ao mundo tudo aquilo que Deus nos revelou através da sua Palavra e de sua criação.

O CULTO A EXPERIÊNCIA

O pós-modernismo instituiu o empirismo como meio de alcançar a verdade, ou seja, a experiência é colocada em lugar de destaque e é tida como o meio de se conhecer a verdade.

Assim sendo, o empirismo radical quebra a barreira da razão e ultrapassa os limites da fé. Pois, supervaloriza a experiência em detrimento da razão e fé, fazendo com que a experiência não precise estar de acordo com a razão e nem de acordo com a fé bíblica. O hedonismo (culto ao prazer) decorre exatamente da supervalorização da experiência.

Muitos idolatram a experiência ao ponto de negar qualquer argumento bíblico e racional que confronte sua experiência. Não é porque aconteceu algo com alguém que isto tem que ser tido como verdade incontestável. Toda experiência precisa ser provada pela razão e pela fé bíblica, a fim de que possa ser tida como verdade prática.

O que vemos nos dias de hoje é que, principalmente no meio neopentecostal, muitos crentes valorizam tanto a experiência que acabam por defender práticas que contrariam a lógica e a Bíblia.

A experiência é sim um meio para compreendermos a verdade, no entanto, somente assim o será se ela for constantemente submetida aos testes da razão e da fé.

JESUS RECONCILIOU A RAZÃO E A FÉ / A RACIONALIDADE E A EXPERIÊNCIA

Diante dos dois extremos: daqueles que cultuam a razão em detrimento da fé, e daqueles que cultuam a experiência em detrimento da razão, qual é a solução a fim de trazer um equilíbrio entre fé e razão?

A resposta, encontramos em Mt 11:27 e 28:

“Todas as coisas me foram entregues por meu Pai, e ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar. vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei".

Jesus é a solução para este problema. O Filho de Deus, ao encarnar, nos deu uma “demonstração da revelação divina e da humanidade perfeita” (Tozer, o conhecimento do Santo, pg. 75). Jesus nos revelou a divindade e Seu caráter, pois, quando olhamos para o Cristo que a Bíblia nos revela, compreendemos pela fé que Deus é todo poderoso e deseja se relacionar conosco, não obstante, pela razão compreendemos tudo aquilo que não tínhamos condições de realizar antes da encarnação de Cristo. Cristo nos mostrou, racionalmente, do que precisamos para sermos salvos e, ao mesmo tempo, nos concedeu fé a fim de nos capacitar a colocar em prática aquilo que assimilamos pela razão.

Se Cristo sempre for o nosso alvo, sempre teremos uma compreensão racional e espiritual sobre Deus e sua vontade. Fomos reconciliados com Deus através de Cristo e, por isso, Cristo, também, reconciliou a razão com a fé a fim de que pudéssemos nos relacionar conscientemente com Deus.

Mas uma vez, a apologética cristã tem que ter Cristo como fundamento de sua argumentação, pois, se assim for, a defesa da fé cristã estará fundamentada no maior dos argumentos de Deus: Jesus, o Deus humanizado!

OS PRINCIPAIS MÉTODOS DE ARGUMENTAÇÃO DA APOLOGÉTICA CRISTÃ QUE VISA COMPATIBILIZAR FÉ E RAZÃO

Como já dito, a apologética cristã tem o objetivo de defender e explicar as doutrinas e valores cristãos diante dos ataques e questionamentos. Desta forma, a apologética cristã clássica tem utilizado quatro tipos de argumentos a fim de estabelecer uma defesa coerente e explicável. Vejamos:

a)  Método Revelacional: Esse método se baseia no pressuposto de que Deus se revelou de maneira geral, através da criação, e de maneira especial, através da Bíblia. A apologética cristã faz um elo entre a revelação geral e especial a fim de fazer uma argumentação lógica e, ao mesmo tempo, espiritual.

b)   Método Cosmológico: Esse método se vale da seguinte premissa: cada coisa ou ser existente no universo tem uma causa, logo, deve haver um ser superior que é a causa de tudo que existe. Esse ser, vai dizer a apologética cristã, é Deus. 

c)   Método Teleológico: Esse método estabelece um argumento fundamentado na ideia de que tudo que existe possui um propósito específico. Neste compasso, o ser humano possui um propósito específico que precisa compreender. É exatamente aí que a apologética cristã entra em cena a fim de revelar, através da Bíblia, qual o propósito de todo ser humano.

d)  Método Ontológico: Esse método se baseia na perspectiva de que se o homem pensa sobre Deus, logo, Deus deva existir, pois, o homem possui um conhecimento básico da existência de Deus que faz com que ele pense constantemente sobre a divindade. O método ontológico se baseia naquela frase de René Descartes “Penso, logo existo”, ou seja, se a humanidade não consegue parar de pensar em Deus, logo, Deus existe e infundiu essa necessidade em nós.

CONCLUSÃO

A razão e a fé são atributos concedidos por Deus e que capacita o homem a compreender a criação e seu proposito diante de Deus. Logo, não são atributos incompatíveis, mas, sim, atributos complementares.

Alan Richardson, no livro “Apologética Cristã”, resume de maneira brilhante a compatibilidade entre a fé e razão, vejamos:

“[...] os homens podem alcançar uma compreensão racional do mundo e de seu propósito, ou finalidade, mas só quando guiados pela revelação divina. É preciso que a fé tome a razão pela mão e a leve a palmilhar o caminho certo. A razão por si não pode descobrir a verdade acerca de Deus e do destino humano, e, mesmo quando tropeça em verdades particulares, não pode ela, com certeza, saber que não são falsas; não obstante, quando a razão é guiada pelos conceitos da revelação cristã, pode ela edificar uma filosofia verdadeira, à medida que avança, ainda que sempre esteja limitada pelas deficiências de nosso conhecimento empírico [...]”. (Alan Richardson, pg 183, ano 1978).

A defesa da fé cristã tem que ser feita de forma a satisfazer os requerimentos da razão, sem desconsiderar os requerimentos da fé. Quando o crente adquire uma compreensão da perfeita compatibilidade entre a fé e a razão, ele passa a ter condições de realizar uma apologética cristã com eficácia e coerência.

Seja um apologista racional e, ao mesmo tempo, guiado pela fé!


Pb. Diego Natanael

________________________________________________________________________

Este artigo serve de material de apoio para a revista de escola dominical da Betel:



Comentários

Postar um comentário

POSTAGENS MAIS VISITADAS

A GRAÇA DE DEUS É IRRESISTÍVEL?

BIBLIOMANCIA: UMA PRÁTICA ANTIBÍBLICA

JOEL 2:28: A PROMESSA DO DERRAMAMENTO DO ESPÍRITO SANTO APONTA PARA A EXPIAÇÃO ILIMITADA!